Em seguida à espetacular vitória do nosso volei feminino nas olimpíadas, as atletas e a comissão técnica ajoelharam-se em círculo para uma ostensiva oração de graças. Não sendo eu mesma religiosa, ainda assim posso entender - por experiência própria - o quanto é instintivo o impulso de gratidão, nos momentos críticos de nossas vidas, ao acaso ou a uma instância maior qualquer que precisamente ali nos tenha favorecido. Deduzo, no caso das meninas do volei, que essa "instância maior" seja o deus cristão, pois rezavam o Pai Nosso, e esta é a oração cristã por excelência, dado que ensinada pelo próprio Cristo. Se fosse comigo essa situação de vitória sobre o adversário, e se me fosse dado acreditar num deus e especialmente no deus cristão, que pelo que andei lendo é para ser um pai amoroso, imparcial e justo, e pai de todos, de todas as bandeiras, penso que se eu tivesse mesmo fé, eu refrearia o impulso de dar graças ao meu deus pela vitória, pois em princípio não me pareceria razoável que meu deus tivesse me favorecido em detrimento de minha irmã do outro lado da rede. E ainda que eu pudesse, por tais e quais motivos, me convencer que o meu deus seria capaz de me favorecer em detrimento de minha irmã, ainda assim eu refrearia meu impulso de ostensivamente dar graças ao meu deus, pois isto significaria sujeitar minha irmã, já em desvantagem pela derrota no jogo, à humilhação pública pela explicitação de seu desmerecimento do favor divino, e isto, convenhamos, nada tem a ver com compaixão. E a compaixão, no meu entendimento, é o centro da idéia do Cristo, ou seja, a experiência da dor dor outro como se fosse a nossa. Mas, como eu não tenho o dom da crença, quem sabe me escapa algo que me impediria de ver aquela "manifestação de fé cristã" como uma imperdoável grosseria com nossas irmãs do outro lado da rede.
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